15 de dezembro de 2006

Balada dos bascos honrados

O poema abaixo, original em basco, transcriei para o português a partir de uma tradução para o espanhol. Como se tratava de uma tradução literal, me senti à vontade para recriar o poema buscando resgatar alguns elementos do original (como rima, metro, assonâncias) que necessariamente se perderam na primeira tradução. O resultado, apesar do intuito de reaproximação, é certamente bastante diferente do poema original, uma verdadeira recriação. Mas como não cultivar a tradição do tradutore traditore?

Não coloquei o original em basco e a tradução que me serviu de apoio por uma questão de racionalidade visual e economia de espaço, mas os links estão logo abaixo do poema para quem quiser comparar.

Sobre o autor: Jon Mirande (1925 – 1972), poeta basco-francês, é considerado um dos maiores escritores da língua basca no século XX. No entanto o basco não era sua língua materna, que só foi aprender depois dos 20 anos. Traduziu diversos clássicos para o basco, como Edgar Allan Poe, Franz Kafka e Federico García Lorca. Suicidou-se, em Paris, depois de uma overdose de barbitúricos.


BALADA DOS BASCOS HONRADOS

..........(Que ao mesmo tempo é uma prece
..........dirigida ao deus basco Ortzi,
..........feita por alguém que não é honrado)


São parrudos, ágeis e afeitos
à boina; a Deus guardam respeito,
falam basco e têm voz nasal;
são muito honrados, afinal
se acham fidalgos... a despeito
de sua maneira vulgar.
(Que o deus Ortzi possa evitar
de eu como eles me comportar.)

Viviam no escuro, no início,
até a Luz cobrir seus patrícios:
Deus e a Ancestral Lei revelados.
Hoje vivem iluminados,
tão iluminados e honrados
feito democratas sem vícios.
(Que o deus Ortzi possa evitar
de eu como eles me iluminar.)

Têm uma cultura tão vasta
de contos, canções e encomiastas;
são entendidos de política,
de futebol, bailado e crítica,
sem falar na música casta.
Até o missal sabem entoar.
(Que o deus Ortzi possa evitar
de eu como eles conjecturar.)

Conhecem as contas numéricas
e se enriquecem nas Américas;
também lá são eles honrados,
reunidos em patriarcados,
apesar da aptidão genérica
de mais na igreja se juntar.
(Que o deus Ortzi possa evitar
de eu como eles ir prosperar.)

Ao casar, só se casam for-
malmente, com a bênção maior
do padre ou da autoridade,
– porque o seu bom gosto, em verdade,
é dentre todos o melhor –
com moças prendadas no altar.
(Que o deus Ortzi possa evitar
que eu como eles venha a casar.)

E quase que eu já me esquecia
de homenagear nesta poesia
sua nacional vestimenta:
a camisa branca, que ostentam
aos domingos – limpa e macia
como o seu coração a amar.
(Que o deus Ortzi possa evitar
de eu como eles não me sujar.)


OFERTA:

Assim como tu, senhor Deus
Javé, já foste dos judeus
o Senhor, e és hoje dos bascos,
que Ortzi não permita que eu,
seja quem for o meu carrasco,
acabe honrado como um basco.

..........Jon Mirande, 1950
..........Trad.: Fábio Aristimunho, 2006


- Compare com a versão em espanhol clicando aqui.
- Leia o original em basco (e entenda tudo) clicando aqui.

Um comentário:

Geraldo disse...

Ótima a transcriação, não ficou tão diferente assim do original, não.

Só acho que o cara demora demais pra passar a mensagem. É um poema de récita.